O CIDADÃO RESPEITÁVEL
Vida é tudo o que acontece lá fora,
mesmo que imóveis permaneçam as mãos,
que se ajuntaram numa oração de artifícos,
para que se guarde a casa, a família e seus vícios.
Sempre vem à boca a retidão das falas honestas,
que mascaram insanos desejos por trás dos dentes.
Uma velhice antecipada pelos melhores costumes,
descrente que tudo passa como trator sobre o jardim.
Por trás dessas cercas tão cheias de pudor e respeito,
a virtude se assente sobre amantes e hematomas.
Traumas tão cristãos quanto pode ser o lar ilibado,
na penumbra das cortinas que assitem a brutalidade.
Enfim, são senhoras quebradas por trás da maquiagem,
meninos calados na clausura do desejo ulcerado.
E a sombra altaneira do deus de ira e punho fechado,
que teme tantas liberdades de quem não pode ficar calado.
E sobre os móveis apavorados, tantos convenientes retratos,
dando conta da casa de fantasmas forjados na mentira
de que o mundo seria terra sem dono e sem poder de fato,
cercado de ateus e libertários por todos os lados.
Uma lástima a insultar o olhos elegantes de quem queria
poder apenas matar o produto de seu ódio de todo dia,
sem que a desonra da verdade lhe expusesse o pecado.