Poema Para Mil Mães
by Clevane Pessoa de Araújo Lopes
O viajor sentiu o choque
e foi violentamente jogado fora
de sua cápsula segura...
As grandes mãos colheram-nos
e a luz do estranho mundo
o cegou.
Molhado, teve frio
e precisou gritar
cansado, o viajor dos duzentos e setenta
dias
(ou teria sido maior a sua espera?)
adormeceu, tão logo foi cuidado...
A cápsula desfez-se
e no ar ficou o cheiro do sangue.
- E o sangue vinha das rosas rubras teu
ventre...
Eu te despedacei, mãe,
quando fugi das trevas...
Sofremos juntos
o término de nossa expectativa...
Eu era uma menina e tu eras
o corpo morno
que eu imaginara...
Havia montes de carne
na tua corpografia
e neles, fontes
de leite forte e branco.
Mãe, fui parte de ti
na longa viagem,
Deste-me até o pulsar
do montor incansável
- teu coração.
Mãe, não te parece incrível que depois
eu tenha podido
crescer longe de ti?...
Mãe, às vezes, quando as luzes
ofuscam-me
e fazem-me mal,
desejo retornar a ti...
Mas eu própria
rompi tuas entranhas...
Fugi delas
quando cresci (tanto cresci!)...
Mãe... podes ninar-me?
Ou devo eu ninar tua velhice
nos meus braços jovens e
aquecer-te junto aos pequenos
montes de minha corpografia,
semelhante à tua própria
corpografia de mulher?...