Alma Preta
Naquele tempo
Talvez uma mulher
Datilografou meu nome
Em uma folha branca
Marcou-me: pardo
Daí parti para o mundo
Já partido de tudo.
E cresci sendo pardo
Árduo oficio desde menino
Ardido por vários motivos
Os ouvidos sempre ariscos
Os olhos sempre arregalados
As pernas prontas a correr
As mãos prontas para bater
Ainda jovem ajudante geral
Geralmente procurando justificativas
Meu cabelo já incomodava o mundo
Minha pele já dava o que falar
Falavam de mim os outros
Eu no modo calado cantava
Naquele tempo
Já gingava como navio negreiro
Já xingava em ioruba
Meu coração um atabaque só
Minha alma sambava no corpo
Me viam sempre torto
Cresci feito de palha, barro e pó
Naquele tempo bem longe
Minha alma já era preta
Isso me desenhou
Me basta.
Milton Antonios
06jun/2024