AQUELE RETRATO

Ainda tenho teu rosto naquele retrato

guardado na segunda gaveta do armário

e no penúltimo escaninho que fica

lá no fundo mais escavado da memória

Restam-te sobras da menina

apesar da recente adquirida mocidade

como nos cabelos assanhados pelo vento

cuja corrente a foto não capturou

e que hoje já não ventanejam mais

Ah! se os retratos falassem

poderia ouvir de novo teu som de pássaro

como ali atrás te escutava bem antes de voares

Mas os retratos são apenas imagens

grudadas no tempo alongado dos papéis

esses pequeninos pedaços de imortalidade

que sobrevivem à nossa repentina eternidade

Será que já passei por ti na multidão das décadas

e não distingui ou reconheci a tua nova face?

Nunca mais teu rosto será como naquele retrato

que trago conservado em alguma cofre

engavetado no fundo recuado da minha história

Joaquim Cesário de Mello
Enviado por Joaquim Cesário de Mello em 03/05/2024
Reeditado em 03/05/2024
Código do texto: T8055652
Classificação de conteúdo: seguro