EU, AURELIUS AUGUSTINUS E O TEMPO
Somos hoje mais vividos e sofridos.
O tempo, que nunca é todo presente,
Vê o futuro impelir o passado;
O passado preceder o futuro;
Ambos dimanando do que é presente.
Sempre.
Somos hoje mais vividos e sofridos.
Nas ações sucessivas e transitórias
Transcorre o tempo, vestígio de eternidade:
O hoje que não se afasta do amanhã
Sem suceder o ontem.
Sempre.
Somos hoje mais vividos e sofridos.
Sobrevivendo ao tempo, para que haja futuro,
Sobrevive o tempo em nós, para que haja passado:
O que ainda não existe e o que já não existe mais,
E o presente que deixa de existir na causa de sua existência.
Sempre.
Somos hoje mais vividos e sofridos.
No fugaz tempo presente que não tem nenhum espaço,
Que, por sua síntese de continuidade, não pode ser dividido,
Ou como astronômico, metafisico e psicológico, classificado:
Tudo é presente. O todo presente. A eternidade.
Sempre.
Somos hoje mais vividos e sofridos.
Lembranças presentes das coisas passadas;
Visões presentes das coisas presentes;
Esperanças presentes das coisas futuras:
Caminha o passado pelo presente ao futuro.
Sempre.
Somos hoje mais vividos e sofridos.
Tempo que nasce do que já não existe mais,
Atravessa aquilo que carece de dimensão,
Seguindo para aquilo que ainda não existe,
Resumindo-se em expectação, atenção e memória.
Sempre.
Somos hoje mais vividos e sofridos.
Decorrem meus anos entre gemidos,
Disperso-me no tempo cuja ordem ignoro.
Sei o que sei, se nada me perguntarem;
Nada mais sei, se tiver que me explicar.
Sempre.