experimento
Atravesso o rio, na margem oposta, talho no tronco
a queda do teu peito,
submerso numa bacia de sangue e doçura,
que murmura pela boca do desejo.
Uma língua úmida e faminta,
esconde sua violência afiada e silenciada,
uma mulher nascida de uma árvore,
com outra brotando na boca,
derrama sua solidão na janela que é minha.
Estou cravado na carne do instante,
uma ferida colossal gira como moinho no teto,
um ventilador sem vento, mas carregado de espinhos
que renova a dor do universo.
Flutuo no meio da sala,
meus cabelos, vastos campos onde uma casa de campo se erige,
e meu nome era trocado.
Minha vertigem, imprópria, mas contorcida,
pois o prazer me era ofertado pelos poros das paredes.
Era ela, a pele, o mesmo odor,
inalei pela narina a lembrança onde eu era crepúsculo e ela, aurora,
uma escoriação na artéria a me fazer correr,
e na manjedoura mais desértica eu morria para nascer em outra sala.
Muitas mulheres estão grávidas mas só ela me terá,
abafado, em rubra membrana para presente,
um tapa e o choro, é meu, silenciosamente é de todos,
o chão trincado e a morte sorriu como se penetrasse
na carne mais profunda.
Esvaziei de mim e agora nasço e ela me tem,
chora, me quer, não quer se dar, entretanto, a vida lhe é,
entre cachos de uvas, entre ruas,
entre essa mão que me chama e aquela que me fez saber.
No fundo de uma pedra um homem chora,
uma mãe sai à noite à procura do marido que sumiu,
amo e odeio como se subisse e descesse no mesmo rio.
É forma ou é cor, o fluido de uma vida desperdiçada,
senhor, que fizestes com minha terra, com minha casa,
o quarto onde ela dormiu e o silêncio era só um jeito
do medo ficar quieto.
Acordo, é noite, abro o vinho mas é a janela exposta
que me mostra o vermelho deslizando entre os pedaços de sonhos partidos,
e o rosto dela, fresco, lindo, lisergicamente elétrico
perde um beijo, e minhas mãos deslizam por toda terra.
Como se o universo fosse erótico e meu sexo fosse um planeta escuro,
ou um astro a ser tragado para o infinito,
é nome dela, da pele dela, do sangue dela,
e sou morro para nascer todos os dias.
E sentir as luzes me dizendo que o perco a cada vez que suas malas estão lá fora,
tento trazer, pra dentro, mas é ela que me guarda nas malas,
porque sou enlouquecido de amor e dói, pelo amor.
Ou por esse pergaminho não leio e sou surdo dos olhos, cego da língua,
e meu paladar não é alfabetizado, mas basta saber que vive,
e que em algum lugar dessa vida, eu te beijo, eu te amo,
e sou com você no escuro mais volumoso.
E somos artistas a nos perder para nos achar no invisível das coisas,
onde somos bichos se comendo como as coisas que se gostam
e a carne arde, e o tremor de um desejo ainda nas entranhas dança,
um sortilégio para um labirinto onde ela é manjedoura e eu renasço perpetuamente.
Ela é a mulher que, após o coito, abre a porta e adentra campos de trigo
que suspiram perdão a cada passo, quando ela se perde para se encontrar
no fogo que esse coração aquece a cada visita.
Ela é um abismo florido ou uma estrada bifurcada,
e em todas elas estou presente,
pensando em como abrir a porta, essa porta que abre todas as outras,
inclusive aquela em somos felizes.