ela é antes, ela é depois

Somente ela na margem do rio, sua imagem

Me chega como se escoasse em uma vertigem

Que a descoloca do mundo, mas na mesma

Medida a faz mais presente no tecido das coisas, nas quais

Os sentidos se imprime como trama que transfigura o desejo

Na matéria feita de carne que não escapa de nossas feições,

pois sua silhueta assombrosa já fez de quem olha um coração

Sem discernimento, condição para que as vozes

Do subterrâneo acorde os sentimentos que não

Existia até que a perplexidade por um corpo que se derrama

Em presença desfalece qualquer impureza que a impedisse

De ser contemplado, um sulco existencial, onde o desejo e

a realização, um em direção ao outro, e como é, sem que a resposta

nasça de nossa razão, mas desse lugar onde está instalada a fronteira

entre o presente e as duas direções que incorpora o homem dentro do tempo, madura é a pedra que sustenta tamanha graça e nos induz a acreditar, logo estaremos, eu e ela, numa boca entreaberta, um ventre nas entranhas que circulam a margem,

Um corte fantasmagórico ou ela não só existe, como forja um

Universo, espaço atemporal, fluido, sentido e extremo no espanto de

se fazer ser visto e ser como a coisa que se olha, embora nunca será,

já que essa beleza o tempo não fere e o espaço não espanca pelo cansaço,

onde poderá ser o mito de um desejo a ser inteirado, desfrutado

como um prato, cujo aroma nos torna parte de seu tempero, e assim

participamos de sua panaceia, já que nossas almas são enobrecidas

que fazemos da pedra, ou de uma árvore nossas cúmplices, já

que elas sabem do que falo porque esse reino desvirginado são

delas, antes que esse poema pudesse entrar no seu solo mais íntimo,

Não há horas quando penteia o cabelo, não há espaço quando

Caminha pela casa, ela se move não movendo, o seu tempo

Não pertence a esse campo, nem a essa vila onde todos sabem

o nome de todos, e o mistério sequer é permeável, já que ele

feito de uma malha tão pequena nos inutiliza em sua travessia,

ainda que nos pareça próximo, ainda que desejamos como

as árvores desejam seus frutos, o céu iluminar a terra, e a luz

escampar de toda barreira opaca que lhe difunde na superfície

e sua graciosidade toma outra expressão, Que a impede de ser ela

mesma, embora já estivesse inscrita no coração das trevas e nas telúricas

paisagens da luz quando meu amor a encontrou vagando por uma floresta

onde o fundo escuro era sua atmosfera a apavorar aqueles que não sabem

De onde vem o azeite, mas sabem que ele gera a luz que alumia

As formas, que torna visível o que antes era só uma presença,

De forma que a linguagem não a saiba, não conforma com suas

bordas, nem com os balaústres que ampara o seu corpo numa

tarde dessas que a vida nos é exposta como se a plateia fosse

nós e não atores desesperados que alguma luminária reacenda o

seu rosto, talvez ela não saiba do perfume que a exala para o nosso

destino, de sua dor tão sensual como ofegante, que, os lençóis mais

do que nós pode recender dentro da noite quente em que sonhamos,

Ela é antes de mim, e depois de mim, há de se saber e que ela também

o saiba que as contas de sua pequena relíquia não resiste ao tempo,

Mas com tempo lado a lado corre em direção ao futuro

Que como de uma árvore, esperamos que seus frutos sejam doces

frutos doces

Ela, antes de tudo, e depois de tudo,

Só, à margem do rio, sua imagem

Me alcança, fluindo em vertigem

Que a desloca deste mundo, mas simultaneamente

A inscreve mais profundamente no tecido do ser,

Onde os sentidos se entrelaçam, transfigurando o desejo

Em carne viva, inescapável ao nosso olhar.

Sua silhueta, um espectro que transforma o observador

Em um coração sem barreiras,

Aberto para as vozes subterrâneas despertarem

Sentimentos adormecidos, até que a perplexidade

Por um corpo que se oferece

Dissolve qualquer impureza, permitindo a contemplação.

Um sulco no existir, onde desejo e realização

Convergem, emergindo não da razão,

Mas daquele limiar entre o agora e o eterno,

Homem e tempo entrelaçados,

Na pedra madura que sustenta tal graça,

Prometendo um encontro - eu e ela,

Na cuspide da criação, um ventre do mundo.

Um corte no véu da realidade, onde ela não apenas existe,

Mas conjura universos, espaço atemporal de espanto,

Onde ser visto e ser fundem-se,

Embora sua beleza permaneça intocada por tempo e espaço,

Um mito aguardando sua plenitude,

Saboreado como um manjar cujo aroma nos integra à sua essência,

Elevando nossa alma, tornando-nos cúmplices da pedra, da árvore,

Que compreendem este reino revelado pelo poema.

Ela, fora do tempo, movendo-se sem mover,

Seu tempo não pertence a este lugar,

Onde o mistério é tecido tão finamente que nos escapa,

Ainda que ansiamos, como as árvores pelos frutos,

Pela luz que dissipa toda sombra.

Ela, inscrita tanto nas trevas quanto na luz,

Meu amor a encontra em florestas de sombras,

Onde o óleo gera a luz que define formas,

Tornando visível o invisível,

Numa linguagem que transcende as fronteiras.

Ela é o antes e o depois,

Sua existência, um fio que desafia o tempo,

Correndo em paralelo ao futuro,

Na esperança de que seus frutos sejam doces.

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todos os frutos da árvore

Abril desvela-se, não se oculta,

como se a eterna procissão dos anos,

incessantes e indómitos,

se curvasse sobre os meus dedos,

e aquela árvore,

altiva testemunha de minha juventude,

ainda me faz indagar

se de seus frutos, sagrados e profanos,

posso me nutrir.

Minha fome, qual lago sereno,

ainda que abissal, contempla,

anseia por ser decifrada em sua essência.

Nos recônditos de becos crepusculares,

onde a penumbra mal nos permitia vislumbrar,

a maciez de suas mãos,

com poros vibrantes como estrelas recém-nascidas,

buscava as minhas,

e essa jovem, ainda mais viva na câmara da memória,

sabia da eloquência da voragem da existência,

antes mesmo de sermos decifrados por ela,

mostrando-nos que a vida, antes de ser sentida,

é uma tapeçaria de cobre e veios de prata,

virgens e destemidos na vontade de não ser enigma,

mas sim uma viagem necessária,

um prazer despojado de palavras,

ou da sombra arrastada por não ter visto

como o céu noturno se assemelha a uma mulher perplexa,

questionando qual parte do cosmos a convidaria para dançar.

Naquela noite, até o silêncio a contemplava,

com uma espera paciente, enquanto a juventude,

como olhos numa jarra de sal, aguarda a carne

para ser curada, sabendo que o fogo já espreita

aqueles desavisados de que há um reino

onde os anos são desviados para ruas de expressão vazia,

uma praia cercada de intimidade, onde as ondas

nos questionam sobre a origem de nossa fala.

Eu, jovem e ignorante de que até os porcos se alimentam na sala,

desde que as palavras proferidas carreguem o amargor

que se acumula nos umbrais de cada conversa,

era uma gravidade atemporal, da qual todos éramos prole,

carregando-a nos ombros, crendo ser um silêncio nacarado.

Não abra os olhos, nem mergulhe nas águas profundas,

nem permita que o asfalto se torne seu manto iluminado.

Aprenda a falar com a pele, a murmurar com os cabelos,

a gesticular com os braços, pois além do fogo,

nada mais há a buscar. É na rua do fogo

que as brasas assam ou consomem tua queixa mais fundamental.

Não morrerás do excesso de solidão, nem da nunca ter escalado

uma montanha, mesmo seduzido pelas estrelas.

Impaciente é a espera, trágicas são as imagens, surreais,

mas não apenas isso; são a flor do real em um campo

injusto de pedras e arames, se lembrarmos dos bosques

que nos cegaram com sua beleza violenta.

Não olhe para uma despensa vazia, desprovida do dia

em que a vida se faz mais presente. Olhe pela janela do quintal,

tua paisagem cordial do coração, pois essa é inabalável,

mesmo que por excesso de exigência nos enganemos.

Os gramados menos majestosos também são generosos

com aqueles que lhes confidenciam um segredo.

E o vazio é sempre um poema a ser feito, uma canção ainda jovem

à espera de tua melodia. Se amargo foi o gosto, é a vida

a mostrar suas facetas mais agudas, sua inclinação mais artística.

Então saberás que navegas em um rio, ou ele te navega

pelos meandros de teus pensamentos, e tudo na correnteza

são cidades em ruínas, pois o mundo se apresenta virgem

àqueles que permitem que as cidades dentro de si pereçam,

devoradas pela máquina do desejo. Simplesmente seja;

e se não for possível, chore desesperadamente,

e como um desalojado, clame aos céus,

pois é de lá que os frutos doces são lançados.