lago silencioso
Numa tarde de quinta-feira, dessas quintas que se dissolvem
na trivialidade do cotidiano,
dias que se perdem como uma fotografia desbotada
ou um filme que finge certezas,
onde o sol brilha apesar das nuvens dispersas,
revela-se uma verdade mais profunda,
uma atmosfera vazia e oca que desperta os mortos
e aqueles rostos exauridos de vida, ainda parte de mim.
Esta quinta-feira, que precede a sexta e sucede a uma quarta-feira não memorável,
me lembra da pulsante realidade do sangue em minhas veias,
da crueza de ter deixado escapar o único momento
em que vislumbrei um rio em meu ser mais íntimo.
Esta quinta-feira, cujas horas se estendem até se fundirem com o horizonte,
não me ofereceu alívio para o zumbido incessante
de um ouvido que teme o silêncio.
Ela não terá um lugar de descanso,
uma varanda acolhedora ou um pomar.
Para ser algo, teria que ter existido.
Mas o vácuo que se desprende das coisas
se desprende também de mim,
como um vaso quebrado que alivia o outro de seu fardo.
E assim, algo me percorre, um tempo, talvez,
ou um fragmento de outro dia silenciado,
esforçando-se para persistir, mas que inevitavelmente escapa,
deixando apenas a impressão de que, em algum lugar remoto,
esse outro dia entende o porquê de terminar assim,
sem uma nadadeira para diminuir este vasto lago de silêncio.