Cantiga de mãe
O véu da noite sombria
Deflorava a madrugada
A planta da flôr nascia
No meu jardim germinava
Margaridas e delírios
Boca, olhos, até, cílios
De toda estória contada
Preenchia-me de rios
Ancos, costas e vazios
Que minha mãe me contava
Eram homens todos nus
De borboletas azuis
Que meus olhos penetrava
Serviam-se da natureza
Serviam-se de toda luz
Não eram anjos, nem cruz
Eram somente fadas
Era tudo tão fantástico
O modo de vida dramático
Que minha mãe me contava
Novenas intermináveis
Corriam-se pelas tardes
Nem que o tempo retarde
O nascimento da fruta
Que ao dia luta por água
A noite solta uma mágoa
Das veredas mais ingratas
Guardo comigo o cimento
Do meu primeiro movimento
Que minha mãe me contava
Loucura, alucinação
Eram tempos bem difíceis
Ao mesmo tempo tão prósperos
Não imaginavam marquises
E nem poços de petróleo
Havia só natureza
Que degustava a beleza
Nas fotos do portifólio
Era quase um monopólio
Que minha mãe me contava