DUPLA FACE
Por Juliana S. Valis
Ergue-se a existência sob dupla face:
De um lado, a vida sonhada,
De outro, a vida real,
E a mente vaga nesse mesmo impasse,
Comparando o que esperávamos ser
Ao que, de fato, o céu revela, ao final?
Se, na vida, não esperássemos tanto
Dos outros, de nós mesmos, do mundo,
Não haveria, talvez, medo ou espanto
Das impressões que nos atingem no fundo...
Pois se conseguíssemos sempre ir, cedo ou tarde,
Além dos ideais da vida e da mente,
Talvez o passado, o futuro, a vaidade
Desaparecessem bem aqui no presente!
Mas criamos tantas expectativas e idealizações
De nós mesmos, dos outros, do mundo,
Que tende a ser um labirinto profundo
Essa armadilha de comprar ilusões,
Em relógios caros de algum ponteiro fecundo...
E, assim, não teríamos essa estranha saudade
Do que poderíamos ter sido, e não fomos,
Nessa ilusão que faz do tempo um alarde,
A sensação de que faltaria "algo" ao que somos,
Como pintores de nós mesmos, além do dia e da tarde?
Mas, na relativa verdade, talvez não falte mais nada,
Se, na mente, o tempo tem essa dupla face,
Entre passado e futuro, a vida é sonhada,
No presente, a vida não requer disfarce,
Ela escorre, múltipla, ao limiar da estrada,
Na incerteza, apenas, com ou sem impasse,
Quando a alma canta e o coração nos brada,
Na dimensão humana que o mistério abrace.
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