SENTOU-SE À ESPERA
SENTOU-SE À ESPERA
arrumou a roupa mais nova
ajeitou no corpo emagrecido de dias
penteou os cabelos
recém lavados
embranquecidos de vidas
colocou nos pés ressecados de andanças
os sapatos não tão novos
confortando os pés
nas meias de seda das meias verdades
destampou o vidrinho
quase vazio de perfume
esborrifou nos pulsos
um aroma cheio de saudade
naquela idade de solidão profunda
ainda se iludia que poderia
ser lembrada
ser companhia
para os filhos
para os netos
naquele passeio
naquele domingo
lembrou-se de colocar na bolsa
o lencinho bordado
a capa dos óculos
e um documento qualquer
que provasse a sua existência
sentou-se à porta
e esperou
e esperou
e esperou…
e descobriu
que ninguém a viu
ali sentada no meio das sombras
que a noite
visita silenciosa
deitou sobre sua espera
sobre seu anseio
a triste realidade
ninguém veio
Biguleto