a porta
Não posso dizer que a porta está fechada
nem me atrevo a afirmar que a porta está aberta.
A porta é o que é, ora aberta,
com sua turmalina tomando a cama,
o sol enfrentando a janela e ela, ali.
Ela está presente, bela,
tão pura quanto indelicada,
o céu que se perdeu e nela encontrou o cosmo dançando
como um pensamento procurando pureza,
e nas entranhas da imagem,
seus olhos como duas frutas doces a arrepiar
o ambiente e nele, melancolicamente, absorvemos
sua silhueta de carne, suas curvas, turva, vulva que dança.
E meu coração é uma noite rodando à procura de seu próprio nome,
acelerado, entre o poente e a nascente.
A plenitude em estado bruto, então busco pelos vãos
da sombra de seu corpo a delicadeza perdida,
mel anunciado pela imagem que faz de mim um refém
que estende a mão, eu digo, me prende, me castiga,
me dê a lição, a nervura de um desejo satisfeito.
Não supero a dor de tê-la e não tê-la,
porque a mesma porta, quando fechada, estou fora,
e tocado e entocado, extremo e perplexo,
o chão não sustenta minha coluna e as gavetas não revelam
a chave mais desejada e não mergulho na água generosa,
porque não há água, nem ando em disparada pela relva incandescente,
porque a relva não é mais o tapete que deixa em brasa cada
passo em direção ao que nos perderemos.
A porta se fecha e o coração absorve da fechadura
sua própria armadura que se perdeu e esbarra na chuva inclemente
que nos põe fora do conforto de braços,
cujas mãos sabem percorrer segredos
acendendo as candeias mais secretas e nos contando
que a vida, que às vezes assombrosa, é linda,
é doce, e a gente é leveza e perdão