ela, eu, ela
A tênue grama desaparece na vastidão,
na formiga que audazmente ascende, desvelamos
a janela, e o infinito se entretece nas
coisas contadas, estranha inadequação
de se concretizar no mundo, lamento, pondero, pertenço
a esta fatia da vida, sobrevivi e transitei pela tarde e a noite
vejo longe das praias, sou o movimento desse mistério,
esta gleba de terra à beira de uma estrada feroz, que
mal compreende que esta vida nos reserva em um relógio,
esses que permanecem nas paredes do hospital proclamando a
hora daqueles que partem para outro reino, senão outro
que nossos passos não dão, e seu rosto que nunca
conheceu sua imagem no retrato se alinha à beira da janela,
cospe de cima, a gota borbulha descendo, no vento ela surfa e se perde
na parede, chora, silenciosamente chama o filho que ainda
no ventre não sabe que chora, nem que as bromélias belas
estão no alto, ama, e ama, mas conhece o sabor do beijo de um
apaixonado, ama envolto, guardado, na timidez do próprio quarto,
escuro, tola autoabrigo-me da luz de minha embriaguez, não
bato palmas para o trinado que emerge das panelas, nem percebo o
sublime de uma chuva no meio de uma tarde quente, fui filho, tive
pai e mãe, e já confessei o essencial, o que mais esperar ou dizer
para aquele que me fala de borboletas na hora do almoço ou lagartixas
quando em carinho, saltei do prédio mais alto, pensava na morte
mas a vida me aplaudiu durante a queda, quando toquei o chão, era forte
minha propensão a flutuar, aprendi que quem semeia brasas colhe fogo
na hora do desespero, agito meu próprio rosto, o calor é de todos, mas
apenas ela bebe a água mais pura, água desenterrada do fundo do coração