A palavra

A palavra não me é como um filho

Que embalo no colo

Ou aconchego em meu peito

Pois é, para mim, transgressão.

A palavra não pode ser arte

Pois que me é pedra bruta, sem lapidação.

Sou da palavra escrava

E ela é rude, franca e dura.

Não burilo a palavra

Nem a azeito com esmero

Ela é osso encalhado na garganta

Ela é um calo no pé.

A palavra que escrevo

Não tem dono, nem se submete

É senhora de si e de mim,

Faz o que entende.

E ela não é madura, não tem rugas

Nem vivências, nem sabenças,

Tampouco seja analfabeta

Mas é jovem, inconsequente.

Se antecipa a palavra

Ao capricho, ao seu tempo.

Gosta de ser vomitada

Amarga. Nojenta.

E essa palavra-orgia

Carimba, decalca.

Não é cozida, nem assada

É crua e atrai grandes moscas.