RECOMENDAÇÕES PARA ILETRADOS E AFINS

Duvide sempre do verso,

do verbo,

de quem escreve,

que se desfaz na escrita,

mas acha que, de algum jeito,

se fez sujeito de suas rimas.

Duvide sempre dos livros,

do mercado de livros,

dos eruditos, dos críticos,

e escritores mais bem vendidos.

Não se perca entre as bolhas de opiniões,

entre as maçantes conclusões

dos tantos volumes de propaganda do status quo, minuciosamente redigidos para sedução.

Recuse as gramáticas

o raso dizer

dos perfeccionismos dos artesãos da linguagem,

Fuja da grande Babel da Modernidade e dos modernismos.

Pense sempre como um iletrado,

como alguém cujos olhos

recusam a escrita,

a indústria, a técnica e o mercado,

mas domina com espontânea maestria a imaginação

e tudo que não se reduz ou se traduz

em letras ou cifrões.

Não há saber ou palavra para a

expressão irracional da vida e da morte,

para a tradução do mais amplo sentido de tudo que existe,

que não cabe no humano,

nem no divino,

e se perde em caos, natureza

e abismo.

Não há correspondência

entre as palavras e as coisas.

As palavras existem em seu próprio mundo,

além das coisas.

Não seja racional.

É mais proveitoso

empinar pipas em uma tarde de sol.