A tênue bruma inodora
A tênue bruma inodora ignora meu nome,
mas me envolve e me adorna como fogo primitivo
que nutre o carvão, as portas das galerias se abrem,
páginas enamoradas consagram a cada passo o ígneo
ferro a revestir o tempo, guardo no bolso o mapa já
temperado do obscuro desejo de que a barriga terra
nos acorde de seu sono, seu rosto me é a luz mais curiosa,
suas palavras, imperiosas e indelicadas, como pulso
de um firmamento sempre desperto me instigam, delicada
é a lembrança que acende na memória, seus braços me
embalando, a música de seus olhos me fazendo flutuar
por uma dimensão tão óbvia que não percebia, o inverno
e o verão são dois nomes de uma casa que nos protegeu,
tuas mãos nas minhas dilaceram o formidável
muro que aprendemos a lamentar, não há muro,
apenas uma penumbra que se esvai a cada ilusão desarranjada, deserto,
céu aberto, lua boiando na água tão funda que se mostra uma
pedra orgulhosa de sua claridade,
a ventania se acalma e os mortos fluem como sereno diante
do sol, sou e não pergunto ao porteiro, apenas ponho os pés na calçada
e pergunto o nome do meu pai, que de longe já me acena com as
mãos espalmadas