cozinha de muitos pratos
Entre um sopro e outro, o jorro estancado
de uma vida cortada, paredes apertadas
onde a dor foi marcada com arame e estacas
da lei, pedras, tijolos, a própria imaginação como
matéria, algo que permanece, resistindo ao vento, ao
orvalho, e ao desejo de se banhar nas águas frescas do
corpo. Uma vida que poderia ser um rio, um campo verde
gravado no cerne das coisas, peles imaculadas das águas
quentes dos vastos mares, uma sereia amorosa que entoa
o enredo que cada pedra, que ao se deslocar nos
move através do tempo que todos compartilhamos, poderia ser
uma rua inflamada com balões e bicicletas ou até mesmo uma
tempestade mais devoradora do que esta, mas que fosse diferente,
que se conectasse a outras com um fio permeado de palavras e sentimentos,
e não esta que se eleva sobre o vazio, que faz da estaca mais
profunda o destino sempre esperado. Obstáculo, espera, o ônibus
atrasado e um fim de festa que se estende, deve haver flores
doces e perfumadas além da barreira, mulheres de mãos amorosas
e queixos decididos, homens de artérias rápidas e de bondade no
sorriso. que não nos enganemos com o cardápio exibido, toda
cozinha é cozinha de muitos pratos