Monólogo da Morte I
Não tenho cor ou palidez
Eu tenho o fio da navalha
Não tenho amigos ou freguês
E a minha intuição não falha
Não passam a vida me esperando
Sou além do calor da batalha
É da Morte de quem estamos falando
Não tenho fim ou sensatez
Eu tenho a praga desses anos
Não tenho pressa ou timidez
Eu falo a qualquer soberano
Eu queria de vez em quando
Ser mais calmo ou mais humano
Mas é da Morte que estamos falando
Não tenho dúvida ou talvez
Eu tenho uma única missão
Não tenho forma ou solidez
Eu sou mais que a imaginação
E se me ouvirem assoviando
De mim já não mais correrão
É da Morte de quem estamos falando
Não tenho contrato ou rigidez
Eu tenho a sua história completa
Não tenho drama ou acidez
Eu sou a chegada mais concreta
E poderemos ir conversando
Fazer a passagem discreta
Pois é da Morte que estamos falando
Não tenho tempo ou xadrez
Eu tenho a poesia do mortal
Não tenho graça ou mudez
Eu dirijo o roteiro universal
Guiando os passos cambaleando
Regendo o ato mais natural
É da Morte de quem estamos falando
Não tenho medo ou estupidez
Eu tenho um reino além do dia
Não tenho cegueira ou surdez
Eu sei que assusto a fantasia
Eu queria apenas um gesto brando
Que me demonstrasse simpatia
Mas é da Morte que estamos falando