Poema sem rosto

Rabisquei as primeiras palavras numa folha de papel em branco

Nada mais metafísico que palavras soltas numa folha de papel em branco

Recorro a um poeta favorito

Porém, nem ele, nesse instante, ajuda

Busco conceber numa frase

O que talvez eu queira minha máxima sentença

Mas de isso serviria?

Tornar -me repetido por gente que nem chegarei a conhecer?

Quanta besteira, quanta falta de senso do presente

Outro dia vi Mário, o padeiro, sair às pressas e entrar no táxi

Ninguém comentou o que aconteceu

Mas o Mário nunca mais voltou à padaria

E a clientela passou a comprar pães noutra da rua de cima

Risquei a palavra da folha em branco

No espaço vazio

Somente o vazio se apresenta

E Mario, e a palavra, deixaram de existir

Dez horas da noite

Lá fora a chuva se fortalece

É preciso dormir

É preciso dormir e acordar

Quem sabe amanhã haja Sol