Escrevo
Escrevo porque necessito
porque o grito do não dito
dilacera minha carne
porque o cerne do meu ser é
vulcânico
água em fúria
coração e cabeça
urgência oceânica
fundação em fundição de lâmina-
língua-palavra-ardente-cortante
que sangra e cicatriza
na brisa que acarinha e queima
teima
inflama
Escrevo porque os silêncios só
são sagrados se
voluntários
e pelos ares
vão
vãos e portas
Escrevo porque a escrita não comporta
mas laceia
teia
fi_ando venho com os fios-herança
esperança-matéria
sobrevivente do sabido
e do que a memória bloqueia
veia
trilhos estreitos
pelos quais correm
vermelhos
todos os códigos seculares
celulares
sequenciados
conexões carne-analógicas
sequelas lógicas
mistérios evasivos
Escrevo porque cri
que criando
escapo das linhas
que rompem os trilhos
Escrevo porque não o faço sozinha
porque me visitam as minhas
porque dizem por mim e comigo
Escrevo porque aceito que o verdadeiro sentido
é cabaça que se alcança, mas não se conta
Escrevo porque palavra é amor-ogó que me aponta
o rumo
porque ajusta a espinha
é fio de prumo
porque bruxa e alquimista,
é humo
porque no viver-marcada
na escalada
é sumo
e no viver-mercado
escrever é fardo
e é numo.