O “SANTO" DO CARRO PIPA
Lá vem apipado d’água
O “santo" do carro pipa!
E pra reunir o povo
O “santo” do carro apita.
Trazendo mais do que água
Potável pra ser bebida,
Trazendo mais do que o líquido
Que salva, da morte, a vida!
Trazendo mais do que água
Pra cozinhar a comida,
Trazendo mais do que o líquido
Que aplaca a sede sentida.
Trazendo mais do que água
Que alegra velho e criança,
Trazendo mais do que o líquido
Que dá saúde e esperança.
Trazendo mais do que água
Pra encher os potes, tonéis;
Trazendo mais do que o líquido
Pra socorrer do revés.
Mas logo tudo se acaba
E carece d'água de novo,
E a vida fica uma escrava
A espera doutro socorro.
A espera d’outra visita,
Do caminhão salvador,
Do “Santo” do carro pipa,
Que socorre o sofredor.
O pobre do nordestino,
Com a sua dura desdita;
Que é facilmente enganado
Com aquela água inaudita.
Desejando que aquela cena
Logo, logo se repita;
Sem saber que aquele carro
É mais do que carro pipa.
Sem saber que aquele gesto
Tem, oculto, uma conquista;
Sem suspeitar do interesse
Do “santo" do carro pipa!
Que aquele carro escraviza
A precisar de guarida,
Que aquele carro é montado
Pra limitar nossa vida.
Pra não sonhar com um poço
E caixa d’água construída,
Pra não sonhar com um rio,
Perene na Paraíba.
Que aquele tanque do carro
Carrega água medida,
Que aquele tanque é gaiola,
Uma prisão escondida.
Que aquela água do tanque
Socorre, mas sacrifica;
Deixando o povo com sede,
Esperando outra visita.
Que aquele carro conquista
Uma gratidão — merecida?
Que aquele carro dá voto,
Uma eleição garantida!
Que aquele carro é fachada,
Tem outra história escondida,
Deixando o povo sujeito
De receber sua visita.
Deixando o povo com sede,
Pra lida ser repetida,
Deixando o povo devoto
Do “santo" do carro pipa!
— Antonio Costta