teu regato
Diante da janela, a noite me observa,
Com seus mil olhos brancos, o firmamento.
Poderia desmoronar a qualquer momento.
Sinto medo, mas quem não sente,
Diante de tanta escuridão?
Na mesa de jantar, apenas um prato,
Tantas outras coisas, vozes, trombetas, tocávamos.
Palavras: éramos uma fanfarra de cristais,
Quebraram, todos se quebraram quando a janela
Se fechou, a diáfana, antiga e orgânica.
Desde jovem conheci esses becos,
É a solidão ancestral, de dias, meses, o lábio
Mal sabe que guarda uma língua e dentes
Afiados, sim, salientes, sabem da pele amorosa.
Se soubesse como tornar a memória mais viscosa,
Plantaria uma flor naquele vaso
Onde uma terra suavemente enfeitiçada me fita,
Teus olhos, que beleza eram aqueles lagos brancos,
Aqueles afogamentos, não esqueço das ondas, esfria
Minha alma quando a trago à superfície do pensamento.
Quantas vezes morri, quantas vezes absorto caí
Em teu regato, e suas águas acariciaram meu corpo nu,
Teu pescoço,
Teu nariz,
Esse queixo nada negligenciado,
Precisão cósmica enquanto vira a cabeça.
Nada me distrai do que já tive em meus braços.