afastamento
Começa o tempo em que a solidão me abraça,
O sol silencioso, apenas o mundo se mostra,
Suas entranhas revelam o esplendor quando clareiam,
Partes para a rua, o chapéu, escudo das pedras aguçadas,
Cai sobre a vida, tornas-te invisível, em atuação brilhante,
Um artista nas membranas do invisível, compreendendo a vasta e terrível beleza iracunda que desce do alto,
De longe, observo tua partida, uma polissinfonia de afastamento,
E alegria, pois se sabes abrir as asas que nos cobrem, sabes também conceder peso às sombras que são leves,
Mas assim, dói como uma pedra desconhecida, como uma casa distante da cidade,
E sinto-me pobre, encurvado sob a luz contestada, tumultuada, manchada,
Em mim, correm fragmentos de enfermidades, clausuras destemidas, sonhos,
Em todos eles, sou uma palmeira ressequida, uma panela sem memória, e uma
Noite que nunca se esvai, exceto pelo movimento das estrelas e a luz que atravessa
O céu para então retornar em outra órbita despida,
Depois, o silêncio amarrado aos pecados, o perfume
Da repetição, a trama sem fim, e o prazer dos encontros, uma memória que, sem o néctar da matéria, serve como refúgio das transgressões,
Pois tudo parece errado quando não é prazer, e tudo parece certo quando me dissolvo diante de teu sorriso e de teu corpo enraizado e iluminado,
Sofro, não sofro, apenas contemplo a moeda
Girando, suas faces em constante mudança, nem felicidade, nem tristeza, uma ponte que não leva a lugar algum,
Exceto a vertigem de uma luz apagada, o tédio de uma luz sempre acesa,
E tua sombra que se oferece, se entrega, eu me estico, sou uma onda a vagar pelo espaço e nada encontro,
Pois eu não existo, nem tudo, apenas dois nadas e o vazio,
Então, me conforto ao ver o sol, que ilumina cercas, carros que passam na rua com suas famílias sorridentes,
A moça que retorna com um sorvete e as pedras que se espalham na via, sou a via,
Sou as coisas que observo, a beleza nua e ressonante que se entrega,
Em breve, a noite, as estrelas e este sofá que suporta meu peso.