AS PAPOULAS VERMELHAS DA CASA
Quero de volta
as papoulas vermelhas do jardim da minha casa
Quero de volta
os supositórios que minha mãe aplicava
a canja de galinha com ovos cozidos picados
o cheiro de Vick Vaporub nas madrugadas
e o sabor meloso do xarope de Melagrião que tomava
Quero de volta
as brincadeiras criadas
com pneus velhos e latinhas usadas
os joelhos ralados das peladas
que curava na ardência dos Merthiolates
e os jogos de tabuleiro que não encontro mais
Quero de volta
o tic tac dos relógios de corda
o nascer do sol que nunca contemplava
o cheiro das pipocas douradas
amanteigadas e salgadas
que os pipoqueiros vendiam
frente aos cinemas na porta da entrada
Quero de volta
o bicho-papão
a comadre fulorzinha
o saci-pererê e a mula sem cabeça
que tanto me assustavam
e o boi da cara preta que minha babá
pra me fazer dormir sempre cantava
Quero de volta
aqueles tempos em que o tempo não passava
a meninice que nunca ali terminava
em meio as papoulas vermelhas
do jardim da minha casa
que hoje habita e respira
embaixo do asfalto da rua alargada
em que minha infância ficou enterrada