insólito
Nestes dias em que a aurora é ausência, experimentamos
Uma espécie de lento ocaso, o peso nos comprime,
Como se o solo nos desvanecesse, o firmamento se alongasse, as coisas,
Sempre as coisas, com seus nomes e enigmas, nos afetam mais
Do que suportamos, triste trilho do obscuro, as múltiplas
Rotas que nos convocam e essa outra, já conquistada,
Há nelas algo que nos transcende, mas que nos consome,
Pois a aventura está nos desvios, turbilhões voluptuosos,
Que nos arrebatam e depois nos lançam com coragem,
Eu amo todas essas sendas, elas nos evocam e evocamos,
Neste encontro, algo inusitado declama como um poema,
Uma luminosa e enferma irradiação nos projeta para o real,
Não posso afirmar que tudo seja fictício nessas odisseias,
Que nos transmudam ou decompõem, um lugar, uma vertigem,
Relembramos nossos títulos, as rochas mais firmes que nos sustentam,
Quando a negritude e suas analogias escatológicas nos devoram,
Não nos entregamos, pois não é de nossa natureza, enfraquecemos,
Porque outrora éramos movidos no interior do vácuo que nos rodeia,
Também é como esta substância, que nas chamas arde e nos distancia,
Sábios e frágeis, o labirinto é nosso domicílio, com alcovas infinitas,
Salões e antecâmaras que nos conduzem à ânsia de expansão, as ruas,
São corredores para câmaras distantes, as praças, pátios imensos,
Onde lemos, meditamos sobre o inaceitável, o incômodo obsceno,
Neste refúgio notável que cresce enquanto nos diminui, trocamos olhares,
Beijos, às vezes amamos com nossa própria carne, vulnerabilidade crua,
Pensamos na morte, a nossa e a daqueles que compartilharam este esconderijo,
Tudo se converte em espetáculo, mais silencioso do que aqueles onde o estrondo,
É a mercadoria mais barata, em alguma alcova, consumimos alguém,
O pensamento, voz do desejo, sabem devorar, somos monstros melancólicos,
Redenção, esperança, palavras que nos consolam,
Diante da estrela sanguínea que nos ilumina, rastros de fulgores,
Nos inundam com tamanho esplendor, homens, mulheres, sementes,
Que incessantemente caem sobre a terra, nos convocando para um porvir,
Que é e não é o local onde a passagem se oblitera, estamos vivos,
Vivemos a morte e a vida, e o trilho incerto, nossa dama intransigente,
Amamos as formas cúbicas, quadradas, esferas sólidas e o vazio que no remendo,
É onde o espaço sem oxigênio nos impele a percorrer.