Esperando o Outono
Posso te contar um segredo?
Eu tenho asma
Quente e seco
O verão me deixa sufocado
Por isso espero o outono
Como quem espera ver o riso do vento
Arrastando as folhas secas
Como se fossem minhas certezas
Não há amor por aqui
Apenas despedidas
A solidão adquire o ar de uma jovem
Ingenua e sedutora
Que pousa sua mão sobre a minha
E diz que é bom me ter de volta
Que sentiu saudade da minha poesia
Em sussurros cada vez mais próximos ao ouvido
No fim de cada tarde
O sol se comove no horizonte
Lágrimas em tons laranjados
Tomam conta da cidade
Como um feitiço suspenso
Como velhas páginas de um livro
Como fotografias em sépia
Como o fim de um capítulo
Espero o outono destinado a trazer
A suave brisa e suas carícias matutinas
O vento forte da noite, expiador de pecados
A mudança de vizinhança de tudo o que sinto
Porque atrás da maquiagem de palhaço
Além das letras de um poeta
No fundo de um poço profundo
No verso de toda minha insegurança
Vive alguém livre
Detentor de toda a liberdade do mundo
Tanto que escolheu
Esperar o outono
Passear de mãos dadas com a solidão
Sorrir daquilo que lhe aperta o peito
Se comover com tudo o que é verdadeiro
E escrever teorias sobre sentimentos distantes
Mas sabe, ainda é verão
Calor, baixa umidade, suor
Tudo tem muita intensidade
E essa intensidade sufoca mais que asma