CAIS

Ela estava ali de  pé no cais.

O vento obstinado a invadir-lhe e desfazer-llhe 

os fios das  pretas madeixas,

O longo vestido negro a arrastar-se pelas pedras úmidas do cais.

O navio que longe vai

deixando rastros de branca espuma no mar.

Ela quis vê-lo partir para aquela imensidão,

Sabia que ele iria, a incerteza eivava-lhe o pensamento:

Será que voltaria ?

Só soube que ele partia,

E entre abraços longos e beijos amorosos

no porto,

Lágrimas que se misturavam.

Ele se foi.

Que os ventos de Oyá  lhe sejam favoráveis !

E as mãos de ambos, acenaram num gesto quase infindo 

de adeus,

Até sumirem no horizonte.

E ela ficou ali, assim, só,

Com os olhos marejados,

Os cabelos desgrenhados,

As fácies pálidas, as mãos gélidas,

O corpo febril em brasa.

Voltarei, dizia ele,

Não voltarás, dizia ela, com a convicção do seu sentir.

O céu tornou-se plumbéo, de repente,

Eolo açoitava ainda mais aquelas águas,

E grandes ondas fustigavam o casco das embarcações,

Que céleres seguiam, as ordens firmes dos capitães,

Resistindo com bravura a relâmpagos e trovões,

Ainda que balançasse forte de um para o outro lado,

Aquela nau,

Só restava a ele rezar

E rezaria,

E na luta justa pela vida, e em face de

tão grande tristeza e tal agonia,

Ele agarrou-se ao parapeito da embarcação,

Atordoado.

Quem sabe mais adiante ela até pudesse virar

e viraria...

E dentro e diante daquela  procela,

lembrou-se da promessa que 

há algumas horas   fizera,

a sua amada, a sua donzela.

Voltarei, dizia ele.

Jamais voltarás, murmurava ela.

 

 

 

Fátima Trinchão
Enviado por Fátima Trinchão em 24/08/2023
Reeditado em 04/01/2024
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