Samba de um Corpo Só

Li que atiraram num pai;

voltando a pé do trabalho,

no condomínio em que morava:

mataram aquele homem.

Desarmado, alma à mostra,

portando perigosamente pele preta;

sacando a chave de casa.

Inocente-morto.

Açoites em legítima defesa,

nos estalos do silêncio do grito dos afônicos;

Gritos em vão. Gritos que vão. Gritos. Surrupiados de ter-se, pelas balas achadas.

No triste sono-lugar onde Traum é trauma, na vida órfã.

Crianças, como se da infância fossem coisas,

crianças da juventude: catacrese suburbana.

Saneamento humano, do apartheid que me cerca no cinza invisível

onde não há cep ou dipirona;

onde se cala sem ter boca,

tragando o seco da impotência nos cacos de ser,

nas chagas d’mãe brasilis de moral-sem-consciência.

Lugar que ser é adjetivo,

ter é verbo intransitivo e amar é utopia.

Desemprego... é to be, na mais amarga dialética leblonina.

Gregos éticos. Carnaval e caipirinha. Très chic.

Regozijo subitamente nesses bolos feitos em casa,

pouco confeitados, é verdade. Quem liga?

Cachorro-quente da carne moída nos 365 dias de sobrevivência.

Tudo, tudo contido num giro terrestre de mundaneidade.

Tudo ao mesmo tempo,

ao mesmo sol,

no mesmo real

da pajero-e-cerol;

Futvôlei-e-assalto;

extorsão-e-belas-artes.

È bello ma non balla.

Bala.

Mais uma rajada.

Corpo ao chão.

Saco plástico.

Poça de sangue.

Chamem o IML:

o filho do abandono chegou.

Só.

Simon Lima
Enviado por Simon Lima em 23/08/2023
Código do texto: T7868523
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