olhar irreverente
Do fogo, o clamor do nascimento,
as paredes ondulam como espinhaço
de aço, repousa, desafia o solo
ou beija a própria face com o
coração no chão, quem
será este, que interiormente
penetra o sentido, o
ardil construído com empenho?
Será a vértebra de alguma
verdade enclausurada, será
a vigia de um mundo decapitado:
ou aquele que
quando a sombra da tarde
repousou sobre o peito,
ocultou-se nas profundezas
do ser? Como pôde, sendo tão vasto,
forte, temeroso,
recear-te, teu semblante sem face,
teu corpo sem pele, tuas mãos
sem dedos, contudo
te observo, contemplo-o como
quem contempla algo que reverenciamos,
mas também acolhemos com apreensão, como
adequar esta morada para que
adentes, se o espaço é
exíguo, mal cabendo o sofá
comprado com sacrifício,
se esvaísses, se cortasses
as unhas aguçadas, o excesso
de teus espasmos, entretanto,
não escutas, almejas unicamente o
que te pertence, a face
percebida por um olhar
reverente.