CREPÚSCULO

Ainda há em mim uma vida que, 

No seu clamor por verdade,

Não deixa de sonhar e de lutar,

Não deixar compor e de celebrar. 

 

Ainda existe em mim um coração

Que irradia inspiração

Enquanto olho para esse crepúsculo

Com uma delicada sabedoria de vida

Que vem despontando

Timidamente com o passar do tempo.

 

Das lágrimas pouco eu posso dizer,

A não ser a lembrança

De cada brilho que um dia prateou

As minhas pálpebras.

De cada dor que já não pode ferir o coração.

 

Mas de tempos em tempos

O fulgor da lírica da fina flor da poesia

Alumia a minh'alma,

Criando novos percursos no meu ser

Como quem não deixa passar

A beleza do instante mais arrebatador

Para povoar nos recônditos da alma.

 

Há em mim, no entanto, um choro calado,

Um choro de emoção em cada poesia escrita

Para lavar o ser de êxtase e sensibilidade.

Mas há também uma alegria,

Uma singela alegria,

Em cada verso colhido

No curso de minha vida.

 

A noite não tarda a chegar...

As esperanças da juventude

Ganham um tom mais nostálgico e saudoso;

E ao mesmo tempo um arroubo

De superabundante fé na eternidade,

Mesmo sabendo da efemeridade da vida.

 

Em cada consciência adquirida

Dou um passo a mais de liberdade...

Uma ilusão a menos a cada dia

Para propiciar uma lucidez implacável.

A poesia ainda grita,

Num despertar impávido

Do sono mortal da alienação.

 

Ainda há uma vida que canta,

Uma vida sensível a voz de Deus.

Existe ainda a poesia que toca as cordas da alma,

Reacendendo o prazer de viver

Mesmo nos tempos mais invernais

Da existência.

 

No crepúsculo da vida,

Como num céu misterioso de fim de tarde,

Vivo sem pressa num caminhar

Mais vagaroso e prudente.

 

Mas nada é em vão:

Todo esse tempo que se escoa

Produz profundidades

Tão misteriosas como o mar na sua profusão.

 

Assim são os anos vividos:

A oportunidade para as experiências

Mais inexoráveis.

E como um muro já prestes a ruir,

Termino de quebrar os últimos tijolos

Que me ilhava numa fantasmagoria de ilusões

E recrio, por outro lado, a vida sem letargias 

A cada renovado despertar.

Alessandro Nogueira
Enviado por Alessandro Nogueira em 01/08/2023
Reeditado em 16/08/2023
Código do texto: T7851227
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