O Ser em Si
Narciso, ao espelho, fita o olhar vaidoso,
Reflete-se em si mesmo, qual estátua de alabastro,
Na estagnada fonte, encanta-se orgulhoso,
Em êxtase consigo, de um amor desastroso.
Em marés bravias, ergue o ego em seu castelo,
Despreza a essência humana, num enleio desmedido,
À sombra de si mesmo, encerra-se no apelo,
Desdobra-se em caprichos, egoísta e perdido.
Negligencia a tristeza alheia, ao lado passa,
Do mendigo ao nobre, cego em sua lida,
Sua sede é profunda, e a sede alheia escassa,
A ânsia egoísta o envolve, amarga e dormente vida.
Na frieza das atitudes, mascara-se em espeque,
Embalado por uma só voz, do ego em comandância,
Ignora o pulsar do mundo, o grito que padece,
Emerge no casulo, num egoísmo em fragrância.
E assim, o Ser em si, preso na própria teia,
Desatina no ego, na órbita do eu central,
Pois no emaranhado, em solitária aldeia,
O mundo resta oculto, em seu ego tirano e trivial.