Carta à loucura

Esta noite me oponho a ti

Opondo-me, trago nos olhos a contradição, pois sei

Que permanecerás aqui

Mesmo pobre de palavras,

Ou farta delas.

Mesmo vagarosa, senão ágil como um cervo. Tanto inteira e próxima

Ou distante pouco em outro cômodo.

E é por tê-la sempre vigente

Que o sossego de um silente escuro

Escutou-me nos primórdios de

Meus clamores em solidão;

Há dois tipos de pessoas solitárias -

As que estão completamente sós

E as rodeadas por pessoas -

As duas sou em natureza

Querendo sufocar instantes desnecessários

Trazer à tona os pedidos inocentados

Pela culpa que trajara os dias

Num passado submerso e mortal.

Como já me fizestes sofrer!

E como já me destes tudo o quanto me

Orgulho por ter...

A ti, loucura, hoje tentar ocultarei o luar

Que nos iluminou todos esses anos

Lua invisível, a todo o olho

menos ao teu

Que tudo vê tudo sente

Tudo suporta e com prazer e lealdade

Incontestável, pois és uma incógnita

Tão bela e terrível e fiel que nos autos

De teus atos as leis impusestes tais

Enormes e fatais.

Amanhã prometo que serás novamente

A companhia de tardes minhas

Noites e manhãs

Dotando as horas de compassos

Exímios e próprios

De tua magnitude musical.

Cantante e sedutora, sei que queres

hoje à noite contínua pousar

Mas digo: uns instantes de sólida realidade somente, devo-me provar?

Saber os palpáveis despojos de

Uma mente total sem ti...como será?

Eu lhe escrevo e não obedeces nunca

Talvez porque sabes que a totalidade

Do real iria à morte me levar - e é

Por isso que estás aqui

Toda nua, crua, indiscreta, presente

Por completo do jeito que só você

Sabe ser.

Ligeia Amanna
Enviado por Ligeia Amanna em 22/06/2023
Reeditado em 24/06/2023
Código do texto: T7820075
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