Batismo
Eu nunca fui de mim
Nunca estive comigo
É que diante dos meus castigos
Nas escadarias do meu abrigo
Eu sempre cometi
Suicídios, desperdícios
E lá sempre dei de comer
Aos meus delírios e vícios
Eu nunca me pertenci
E nunca sei pra onde vou
Porque não costumo demorar
Nos lugares que não estou
Seja eu talvez
uma mistura heterogênea
De luz de vela e motins
De novelas e novenas
De bolhas de cetim
De ditados sem fonemas
Me procuro no outro
Porque é nele que me percebo
É nele que me beijo
É nele que desconheço os meus rostos
Que adoto os meus abortos
E quando "esse outro"
Cansa de me enganar
Derrama suas pálpebras
No chão do meu olhar
Sigo rastejando meus sonhos
Me pendurando no mural de estranhos
Tentando me imprimir
Molhando o colírio
Sem deixar rasuras
Nos olhos daqueles
Que estão à minha procura
Pra saber o quanto dói
A inexistência que em mim corrói
Porque perder-se dentro de si
Sem se despedir
Manifesta n'alma
Medos e fissuras
Geleiras de ternuras
Sem nomenclaturas
E sem abreviaturas.