O DIA EXTRAVIADO
Hoje achei um dia que estava perdido
e nem me lembrava mais que o tinha vivido
Ele foi achado no fundo de uma gaveta
do bagunçado armário da memória
entre tantos outros pedaços de dias lembrados
que compõem os anuários da minha história
No lugar onde me sustento e me guardo
sou confuso, embaralhado e desorganizado
e em meio aos entulhos de coisas que trago
tem vezes que nem sei direito quem sou ou fui
e no emarando de mim de quando em quando
me desoriento, e perdido não me acho
Não sou cartesiano nem muito menos linear
me atrapalho até em saber onde deixei
o retrato do dia 28 de abril de 1994
enquanto o ano de 1974 fica acima de 2002
que fica logo depois do dia de ontem
em que passei a tarde tentando lembrar
em que parte de mim foi que deixei
meu vigésimo terceiro aniversário
logo eu que já esqueci o que foi que comi
no almoço do penúltimo domingo passado
O dia que finalmente encontrei está esburacado
dele apenas vejo uma fração de minuto
como se o resto fosse dissolvido no ácido do tempo
ou ainda deve estar por aí rasgado em pedaços
misturado a estilhas dos dias que me foram sepultados
no cemitério das ausências e dos esquecimentos
No dia da minha autópsia
encontrarão no interior de mim
todos meus carcomidos calendários