chove, chuva
se lá fora agora chove,
e muito,
aqui dentro
uma tempestade ácida
me inunda
eu sempre me afogo
sem água
meus sentimentos estão
desérticos
sou um cacto guardando as lágrimas
hoje não mais
rezei, pedi aos céus
pra que eu chovesse também
não são só as nuvens que precisam
descarregar
ora raivosas
ora generosas
tem gente que ama uma boa chuva
tem gente que odeia a velha chuva
nostalgia, ó grande espada imaginária
de dois gumes
me dilacera o peito
pra jorrar os sentimentos
que diz, em meio à angústia
e solidão de quem ama,
antes sentir saudade
do que não ter saudade pra sentir
significa, em todas as línguas
do sentido,
que por mais agonizante que
possa ser, e é,
pior seria nada ter vivido
se eu choro a perda
é porque um dia tive
se eu sofro com a partida
é porque foi bem-vinda
mas hoje o que sinto não sei
se é exatamente saudade
porque a lembrança quase
não alegra,
machuca,
mas não serei eu
que negarei a falta
que a falta faz
isso dói como uma saudade
porque um dia esteve, mesmo que faltando,
e hoje não está mais
não nego que agradeço
por terem ouvido as minhas preces
não gosto da chuva por achar triste
mas chover é preciso
e eu preciso ainda mais