Uma vez por mês

Uma vez por mês

pago a conta do telefone,

do cartão de crédito

e outras mazelas mais.

Tenha ou não tenha dinheiro,

tenha ou não tenha vontade,

sim, uma vez por mês.

Uma vez por mês

deveria receber um salário,

mas meu contrato é comigo.

Uma vez por mês,

durante quase trinta dias,

fico na espera do óbvio.

Mas o óbvio não é tão óbvio

nem uma vez por mês.

Uma vez por mês

deveria trocar a escova de dentes.

Mas às vezes passo do tempo,

e ela me olha assim,

destruída e arreganhada,

e quanto mais a uso,

mais ela sorri.

Uma vez por mês

fico triste e me sinto só.

Acho o mundo ruim,

acho as pessoas más,

acho que não há saída.

Mas uma vez por mês

eu sangro,

e uma vez por mês acabo achando

(de novo)

que não era nada disso.

E o tempo pauta os atos:

deveria lavar o carro

ao menos uma vez por mês.

Seria bom arrumar as gavetas

ao menos uma vez por mês.

Queria encontrar meus amigos

ao menos uma vez por mês.

Mas o tempo não se fecha

num mês de trinta dias:

o tempo é fuido como um rio

e se esgota como areia

numa gigantesca ampulheta

de duração indeterminada...

Ao menos amar não quero

com data marcada.

Sim, amar um mês de uma vez,

mas que essa vez não fosse só

uma vez por mês.