A melhor companhia
É na solitude que me crio e me recomponho.
Vivem em mim todos os silêncios.
Nasci só e reconheci-me só, desde o começo.
Pequena, sorvia com gosto os interstícios entre as interações.
Afastava-me e observava o burburinho.
Ainda hoje tenho olhares de espectadora,
apartada da cena que se desenrola à frente.
Assim, fui terapeuta de mim mesma,
alternando a cadeira e o divã.
Estar só não me assusta, absolutamente.
Convivo em paz comigo mesma,
temos longos e silenciosos diálogos
nos meandros da mente.
Talvez daí decorra uma autoestima realista mas poderosa
que legitima em si esparsas qualidades
e identifica múltiplos defeitos da minha natureza humana.
Vivencio a jornada da solitude,
desapegada do mundano
mas ainda muito distante da luz.
Resta-me manter-me caminhando e aprendendo.
Para isto, a solitude é uma Mestra perfeita.
Na solitude, basto-me.
Ao bastar-me, consigo deixar abertas as portas para que outra solitude marotamente espie e,
quem sabe, em si também se reconheça.
Reconhecendo-se, talvez convide-me a dançar.
Não o fazendo, danço só, leve e absorta nos rituais dos solstícios e equinócios.
Neles, transbordo toda a alegria de estar viva, de olhos bem atentos e abertos.
Sozinha, cultivo a minha inteireza.
Não estou à procura de metades.
Genuinamente, sinto-me em paz.
Só há paz quando amamos a quem somos, como somos, porque somos o que somos....
Nasci só e reconheci-me só, desde o começo.
Vivem em mim todos os silêncios.
E na solitude, me crio e me recomponho.