tempo e amor

sair por ai andando, sem rumo

foi destino de muitos dos que me antecederam

quando a agonia toma conta do peito penso no mesmo

sair, por ai, desbravando

encontrando caminhos novos pro meu eu

maneiras outras de poder existir

me deparo com o espelho dizendo que já não sou mais uma menininha

o mundo já não me quer mais como já me quis um dia

habito o medo ou o medo me habita

temendo o mesmo destino

as mesmas ruas

as mesmas esquinas

as mesmas solidões ...

como me encontrar aqui?

onde já estou

desfrutando de amores que vezes parecem aprisionar

algo que quer voar

mas não tem terra para repousar

terras essas que um dia foram tiradas dos meus ancestrais

junto com as almas,

as crenças,

as famílias,

os laços,

os afetos,

os nomes,

as infâncias,

as juventudes,

os repousos dos longevos

restou uma ânsia por revolta

por justiça de xango e não de themis,

que é cega e tenta cegar também a todes nós

deixando o emaranhado da confusa colonização

que de confusa tem somente a mentira do porto, do cais

mas que claramente, mente, branca e impiedosa

a ânsia pela retomada feita por nós e nossos parentes

feita com flechas e sem armas de fogo

tecidas com lanças buscando o destino febril da maldade

acertando o peito fálico

o corpo tosco do poder

encontrando o quilombo

aquilombando as consciências

enegrecendo e sendo corpos vivos

quadris que se movimentam em direção ao amor e o tempo

onde as ruas são encontros

as esquinas grandes surpresas de alegrias

e a solidão seja a de ver, sentir e interpelar as questões que habitam o buraco da existência na terra

mas que abraça a busca por ser, somente ser

em grandes círculos ao redor do fogo

o tempo e o amor.

Michela Buck
Enviado por Michela Buck em 28/02/2023
Reeditado em 07/03/2023
Código do texto: T7729488
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