SOMOS
Somos como os que não voltam
Às cinzas de quartas mortas,
Trôpegos brasões da escória
Errando ruas e portas:
O engulho indigno das horas
Será nosso Ora Pro Nobis,
Nós, o dejeto da História
No fátuo aqui sem memória.
Outros celebrem no tempo
De força e avivamento,
Não nós, em vício e lamento
Forjados, farsa em portento --
Somos o olho de imenso
Abismo faminto horrendo,
Chamas num mundo de extremos
Entre o que é puro e o excremento.
Urros orgíacos, burros
Sem rumo, fruto ou futuro,
Nosso querer é o monturo,
Escombros por testemunho
Do que se erguia no escuro,
Vil logradouro do orgulho.
Do quanto resta, esse apuro
Sem porta ou grades, sem muro.
Vamos sem graça ou beleza
A meta inútil das bestas,
Queixas servis desonestas
São nosso mote e destreza.
Menos que justos à mesa,
Tolos cantando certezas
Sob trincas de mil represas,
Somos vaidosa fraqueza.
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