Bom português
Era uma menina minorca, com a língua afiada por um bom português.
Conjugava verbos e falava todo tipo de calão, só não falava changana porque era língua de cão.
Desfilava a classe com seu bom português, com a mãe advogada e o pai filósofo, não tinha como não viver estes clichês.
E o tempo foi passando, e ela crescendo.
Terminou o primário e o secundário, somente restava-lhe o momento lendário: a Universidade.
E quanto mais o tempo passava ela percebia que não podia, não podia falar a língua que a sua pele pertencia.
Não podia falar do que em norte acontecia.
E na maior inocência o seu pai pergunta, filha minha o que quer ser quando for mais crescida? E ela cansada de fingir, decide romper o silêncio que estendia por anos.
Eu quero ser poeta.
Mas que raios é isso de ser poeta?
Ser poeta é viver quem está morto.
É falar sem pedir permissão, é dizer asneira e mesmo assim ter razão.
Ser poeta é muito mais que ter um bom português.
É aceitar suas raízes, e não dar importância ao verniz.
Mas poesia não é igual a medicina, poesia é arte que a rua ensina...
Não é igual a Monalisa,
Poesia é arte que não deixa herança, e sim esperança.
E já que não podia ter sonhos fora da caixa, a mamãe advogada mete ela em um Tribunal sem direito a advogado de defesa, somente da acusação.
Afinal de contas, ser ou não ser foi sempre a questão ou obedecer ou não obedecer?
E no final do dia tudo se resumir a nada.