INVENTÁRIO DO QUE NÃO VEIO
Nunca veio a boa vontade...
Nem nuances da verdade.
Nunca o sorriso espontâneo.
Não veio a mão no ombro.
O colo solidário
O sentimento caridoso
Ao suor de todo esforço.
Não veio a gentileza
A presença companheira.
A consideração afetiva
A preocupação condoída
Não veio a mão benfazeja...
A palavra bem postada
A afagar as caminhadas.
Não veio a alegria de doar
Só a ânsia de tirar.
Nunca uma esmola esmiuçada.
Nem à face esfacelada
Do pedinte da calçada.
Nunca o pedido da conta!
Nem num mero "faz-de-conta".
A mão flácida pelo bolso...
Sem que houvesse um reembolso.
À sobrevivência nas carências...
Veio apenas a aparência.
Nunca veio...
A vivência enlaçada
No propósito das estradas.
Nunca o abraço energético
como veredicto profético!
Que não fosse retirada
Na contagem performada.
Não veio o cafezinho da tarde
O sorvete de morango
A água de coco no parque...
Nem a empatia do engano.
Não veio o afago à criança
Assustada com a herança.
Nunca veio a iniciativa
Nem ao bilhete de partida.
Não veio o reconhecimento
Nem num altruísmo passageiro,
Não veio a felicidade de estar
Nem o desejo de ficar.
Não veio a lágrima verdadeira
Nem o desejo turbinado
Nenhum colo ao cansaço.
Nem a comiseração
pelo traço da ilusão.
Nunca o coração apertado
No egoísmo todo herdado.
Não veio a peça ao descanso
Nem o perdão pelo engano,
Nem um olhar condescendente
A toda dor adjacente.
Nada veio
Ao tanto nunca ocorrido...
Nem um sopro prometido.
Apenas constou num inventário
Como prova em sudário
do que poderia ter sido.
Veio um tempo só correndo
A cobrar seus dividendos.