Através da janela
Da janela do hospital eu olho para a rua, mas não vejo nada! Nada que essa mesma janela já não tenha me mostrado um milhão de vezes! Nada que me faça querer continuar olhando para o lado de fora.
Mas eu estou preso nesta visão fixa, condenado a observar uma interminável repetição de acontecimentos não concluídos. Quando vejo os carros e pessoas indo e voltando de algum lugar, nunca sei para onde vão, de onde vem, nem o motivo. E provavelmente nunca saberei.
Sei apenas que se movem. Consigo saber somente o que a janela do hospital me permite vivenciar.
Por esse motivo, para mim, não importam mais as nuances do que se apresenta do lado de fora, estejam elas relacionadas às características dos veículos que trafegam pelas ruas: suas cores, marcas, luxo ou ausência dele; ou na aparência, roupas e problemas das pessoas que transitam pelas calçadas. Não ligo se alguém lá fora sofre, chora, ri, ama, odeia... Para mim, todos esses eventos externos se mostram como pequenas partes do meu dia, que juntas compõem a mesma e monótona moldura da imagem por detrás da janela deste quarto. Imagem que sou obrigado a rever durante todos esses anos. Concluí que quando passamos tanto tempo olhando para um só lugar, não há diferença remanescente que não venha a se transformar em um hábito sobre si mesma.
Por mais que todos os dias vários acontecimentos se façam presentes no mundo, para mim, nenhum existe da janela para dentro, assim como eu não existo no mundo, da janela para fora.