NUNCA MAIS

Nunca mais esta quarta-feira

Nunca mais

Debaixo do sol do dia

e do olhar alheio das estrelas

nenhum dia é igual a outro dia

Nunca mais

Não haverá outra vez quarta-feira

o porteiro gripado

o semáforo apagado

o carro quebrado

o pedinte atrasado

a comida estragada

aquela topada

a bolsa na esquina roubada

e a criança chorando

na casa vizinha do lado

Nunca mais

Nunca mais verei de novo

o mesmo pássaro voando entre as árvores

o ônibus lotado com as mesmas pessoas

o idêntico minuto do minuto passado

o igual odor dos bueiros

o mesmo filho ser enterrado

a moça sentada no banco da praça

com as pernas cruzadas

esperando talvez o namorado

enquanto a bicicleta passa no buraco encharcado

salpicando água enlameada na calçada

Nunca mais te abraçarei desse jeito

como te abracei no meio da madrugada

quando acordastes assustada

no instante em que entrei no quarto

para visitar teus sonhos quietos e calados

Nunca mais terei esta fiel idade

que logo se vai

no interior desta quarta-feira

que de novo jamais se repetirá

Nunca mais

Mais uma vez e como sempre

esta quarta-feira nunca mais irá retornar

nem na próxima quarta-feira

que estiver no seu lugar

Nunca mais

Joaquim Cesário de Mello
Enviado por Joaquim Cesário de Mello em 21/12/2022
Reeditado em 21/12/2022
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