quando eu for pedra...
Quando eu for pedra
Não mais escolherei meu rio de fluxo
seguirei a esmo, corredeira abaixo
tanto quanto as gentes seguem, uma a uma;
e já não darei conta de não ter mais sentidos de sentir.
Quando eu for pedra
rolarei pelas vertentes das águas
límpidas e barrentas
Sem saber a diferença!
entre o elixir dos sóis
e a lama que assoreia as vidas que não são.
No dia em que eu for pedra
Sequer olharei do lado
e já não sentirei a dor que pulsa escondida
pela veredas do tempo,
dentre o verdume que tomba alheio
abatido pelas mãos insanas;
porque toda pedra que é pedra mesmo
já aprendeu que nada domina a força das inconsciências.
Quando eu for pedra
mas pedra de rocha resistente!
jamais voltarei a me disfarçar de poroso arenito
essa mera fantasia resiliente
Estereótipo do dureza que nunca foi,
a dessas pedrinhas falsas que carregam erosões forjadas,
que só se fingem de inanimadas
mas que se dissolvem ao mero sopro dum vento raso.
Quando eu for pedra
optarei por ser pedra empedernida mesmo!
Sem chance de enxergar!
Muito menos de entender os rios!
tampouco a corrupção das suas frágeis paredes de sustentação.
Pedra sem olfato às podridões das margens poluídas
das torrentes que sugam vidas.
Pedra legítima!
Pra nunca sentir saudade.
Assim,
quando enfim me chegar
a alegria de ser pedra sem as algemas do sentir
sei que seguirei a esmo, livre como pássaro que voa
sem saber que tem o céu sobre si.
Serei pedra legítima, derretida, mas de magma!
sem forjadas lágrimas convenientes
frente às dores das tantas gentes...
Pedra rolante na vertente das realidades,
Sem a hipocrisia das falsas bondades.
Serei pedra de rocha vulcânica
Da convulsão vinda
lá de dentro,
da explosão do irremediável e do intangível
como poesia morta
solta na correnteza fumegante que chega
e tudo arrasta...
Pedra decidida a também rolar na marra
por sobre a dureza da terra batida, tão empedernida!
Sempre sem destino certo.
Pedra...somente a rolar
e sem nunca mais olhar para trás.