CALABOUÇO — 23h42 —

Vejo um verso na poeira

camuflada sobre os tacos

da sala — e na luz acesa,

inútil no meio da tarde.

E na fuligem eu escrevo

sua partitura com lápis

sem ponta, sob esta regência

da batuta longa das almas

que sobrevoam e desdenham

das madeiras velhas do quarto,

e do vapor que as desenham.

Mas noto, antes da virada,

que, em mim, não há o poema

dissociado das imagens

fixadas na cal das paredes

— a perfeição dos seus buracos,

entre as neves dos seus seios.

E são tão claros os detalhes:

o colo, a bacia farta,

e a delgada silhueta

da sua rosa orvalhada.

Pelos loopings das suas cenas

que mantenho minha estada

na masmorra da noite quente.

— E tudo, por fim, se acaba.