Eu confesso
Você é como o perfume da flor
Que ontem eu matei.
Tens o cheiro do campo, do mato, de natureza morta.
Ante meus sentidos
Se humana fosses
Lhe imagino com os cabelos soltos e esvoaçantes
Blusa branca como um lírio
Vermelhos lábios de roseiras bravas.
Seus olhos prenunciam inocência
Tua essência uma alameda florida
Como aquela que ontem caminhei.
A cada passo eu cobiçava - lhe
Cada instante pensava inquieta:
Lhe terei pra mim.
Com meus delicados dedos lhe envolvi
Com amor sublime nos olhos te vi
Com bondade e ímpeto, tirei-lhe a vida.
E o que é a vida de algo tão belo
Como outra flor que ontem também, matei?
Eu sou mais uma a não saber o que fazer
Num mundo com tanta beleza
E você é pra mim como um selo
Algo que significa mais que conquista
Você é pra mim o rastro das plantas esverdeadas
E os ramos das videiras maduras.
Da vinha furto-lhe o fruto
Do solo quero respostas sanar.
Eras tais margaridas, girassóis
Sorridentes e felizes
Agora só vejo o que permite -me ansiar
Desejar por ter a natureza pra mim - embora tente eu não posso ter a natureza
Alentado o princípio da dor
Eu sofro mais que sofrestes
E com meu coração dolorido e anestesiado
Venho lhe pedir perdão.
A cobiça assemelha-se ao amar?
Realidade busca obsessão
Eu peregrinarei ao além
Onde fores, lá estou
Antes mesmo de meu nome falares
Eu sou.
Com benignidade e cruel passional impulso
Fiz com que tuas pétalas ao chão fenecessem
Bem ali as sinfonias da perdição
Soaram ávidas e contrastaram-me
A face que lhe sorria
Eu me recuso a crer que meu próprio desequilíbrio, no ébrio
Lhe deste paz - pois até o mundo das plantas
Sofre e versos faz.
Viver aqui é sacrilégio, eu sou prova disto
Um ser tão miserável
Que não contem-se
Em observar a beleza das flores de longe - quer tê-las em mãos
Apreender o belo, fazer-se seu
O mundo chora, e eu também.
E o que é chorar, rara flor?
- chorar é como estar na chuva de verão
- como uma flor na chuva sou.
- aqui, ao vento tempeste me faço
Eu fiz um túmulo pra minha flor
E o visito quando chove.
E quando durmo, sonhos : olhos de flores
Sou tal alucinação, venho cedo
Tarde parto
Levo comigo o sussurro das almas inquietas - e a cada passo eu ainda não sei lidar com tanta beleza nesse mundo.