Poemas Chuvosos
(I)
Os muros me guardam,
incansáveis sentinelas de cal,
enquanto eu arfo e passo
feito o fantasma de um afogado
pela rua alagada,
vendo minha imagem projetada
na água das poças
como um belo e recalcitrante náufrago urbano.
(II)
A cidade expõe suas luzes,
sua usina de sons e cores,
sua pirotecnia, os carros
mergulham na deriva
irreversível das ruas
e estrelas afogam os dias
em solidão e antidepressivos.
(III)
Olho da janela do apartamento
a cidade engolida pela chuva,
a praça ilhada, as nuvens
enforcando arranha-céus perdidos,
e lá embaixo, como pontos
difusos de semi-sonambúlicos,
sombras disformes bailando
em leve angústia diluída.
(IV)
A chuva se esfarinha
sobre o concreto armado
da seca realidade...