tempos de Gabber

Não, não vejo no vagar dos dias

a lanterna que contorna, a luz

que nos daria o brilho do futuro.

também não vejo as novas formas como

a casa de novas vivacidades, vejo o rio

a correr mesmo que sua cor seja dada como

incerta.

Aos domingos não vestimos a roupa nova, nem

o parque nos espera, na verdade não há parque,

nem circo, nem a rua das brincadeiras, as casas

estão mortas, não há vizinhos que nos indica a povoação

do mundo e do desconhecido.

o coração não brilha mesmo ao sol do meio-dia, sem

brilho seco, duro, onde o ódio e ressentimento

é a lamparina que nos dedura.

sou homem, ando pouco, e minhas pernas

sabem o nome das montanhas, e dos vales

conversam como dois humanos, no tempo que digo

não há a distância a percorrer, nem o tempo que

nos estrangula, apenas o ar sob suspensão e baforada

da gangorra soletrando nosso atraso. hoje vi uma moça

de saia, descia a rua com sacolas, sem saber seu nome,

soube de suas agruras, mas que carregava uma rosa, andava

como se anda o tempo circular, indo como se fosse chegar,

os amigos não são amigos, nem os inimigos nos lançam

fogos e azeite quente na hora do jantar, são rostos

que vem e que vai, que nos impoe seus destinos e nos

e nos coloca no ventre de nós mesmos, amei cada um

e fiz de outras a tormenta que sacode o deserto sem vida.

prossigo na mesma e bela estrada, mal tratada onde o abismo

dança com as camélias do baile dramáticos na mesma jornada,

as pedras no dizem que não tem olhos, mas por nos dizer,

tem a boca do pensamento e nos que outros pesam mais forte

no ventre, dói saber vivo, pois saber vivo também é saber morto

quando contraímos o tempo, mesmo que seja em pensamento, saber-se

se vivo é saber-se morto, ainda que andando sobre a copa do firmamento.

os destroços do tempo pelo caminho nos indica o desvio,

a dor é o motor mais ordinário, porém pelas árvores

os cantos inertes de uma vida nos alimenta como o voo

os canários, amarelos, arisco, sem risco, fazem do céu

com seu voo curto a extensão das coisas que encantam,

lembro-me dela, do andar silencioso, puro, livre como

arbusto preso a terra, onde a ventania leva flores ao

ao impuro da relva, beijo a memória agradeço ao tempo,

a sua flecha de sangue agonia, serei um que esse pensamento

de outro, serei um dia, o coração bate, a vida é de ardência

que dar medo, correndo ou parado, nossas coxa é adornada de

medo. se amar é doer, aprendi a a fase que mais fugimos, entrar

na rua aberta, ou no profundo descoberto, trago pra pra fora a coisa

que já foi, olho-a com a ternura dos primeiros anos, sou o que sou,

sou sendo, sem saber pra onde vou

Ariano Monteiro
Enviado por Ariano Monteiro em 01/11/2022
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