CRIATURA ALOPRADA
Amor, salamandra matreira
de nervuras aflitas, gananciosas,
de estações secretas, soberanas.
Amor, repleto de vãos, becos e sombras,
untado de sinos e repiques mil,
lotado de porteiras escancaradas, descaradas.
No amor toda razão derrapa,
toda certeza agoniza,
todo senão abdica a coroa.
Do amor, perdigueira mãe,
criatura endiabrada, aloprada,
cigano à procura de abrigo, de redenção.
suor â cata de qualquer alforria.
Amor, gargalo solene, véu espesso e rouco,
lastro que nunca desafina, nem resvala,
torpor vadio, abençoado e vil.
Amor de pétalas faceiras, desarrumadas,
destrona Deus quando bem quer,
arrebata o melhor dos dias, os piores idem.
Na sua fonte refiz meu legado,
na sua fé afiancei meu canto maior,
no seu arremate esqueci a que vim.