A SAGA DOS EXCLUÍDOS
Quando nascemos eles dizem:
Lá vem mais um marginal
De uma família desestruturada!
Se for menino será um pivete,
Se for menina, uma fraquejada!
A parte desta lei amaldiçoada,
A gente ignora e cresce.
Já adolescente escutamos
Se formos avessos a porrada:
Esta atitude é afeminada!
E se a jovem não for depilada:
Como é feia esta macaca!
A parte da ofensa orquestrada,
A gente ignora e cresce.
Adultos, sem carteira assinada
Eles postam sobre nós piadas:
Aquele ali tem medo de enxada!
Aquela feia vai vender chiclete!
Atacam entregadores na estrada.
A parte desta gente desaforada,
A gente ignora e cresce.
E quando aquela vaga disputada
Do concurso ou faculdade vem?
Ouviremos deles o pior desdém:
A facul virou uma maconhada!
A cotista precisa ser boicotada!
A parte da maldade tolerada,
A gente ignora e cresce.
Rompendo o sistema elitista
Alguns de nós vencem na vida
Sem serem atletas nem artistas
Olhem aqui na Disney a gentalha!
Pobre de avião, ninguém merece!
A parte do nojo desta canalha,
A gente ignora e cresce.
No exercício de nossa cidadania
Deles sofremos o sarcasmo:
Olha que ridícula a feminista!
É um mortadela sindicalizado!
São uns desgraçados vitimistas!
A parte destes desprezo e ira,
A gente ignora e cresce.
Chega! Nada será mais ignorado
Minh'alma deste povo se cansou!
Hoje devolverei a este alienado
Todo mal que na vida ele causou
Seremos um vulcão reativado
Que explodirá na cara do doutor.
A parte das ameaças dos reaças
A gente não mais ignora nada!
Nem as balas, fuzis ou blindados
Nem suas marmitas e salários
Nem que sejamos exonerados
Hoje vingaremos os maus tratos
De toda uma vida de humilhados
Hoje cuspiremos em seu prato
Cheio da miséria que nos ofertou!
Vem à urna povo, hoje somos reis
A democracia hoje nos iguala
Já apanhamos, agora é nossa vez
Patroa vale o tanto da empregada
Sem medo, nada impedirá vocês
Não temam soco, faca ou bala
Hoje o chicote deles não estrala.
Para comandar nossos destinos
Não quero mauricinho de jetsky
Que nunca trabalho ao sol a pino
Que sobre as mortes diz: e daí?
Que faz piadas com o nordestino
Que dá fome do meu povo ri
Fora lambe-botas de milicos!